Tudo o que você precisa saber sobre prolapso genital


Provavelmente você já ouviu falar em “bexiga caída”. O que é vulgarmente conhecido dessa maneira também pode acometer não somente a bexiga, mas também o útero e o reto, por exemplo. Estamos falando do prolapso genital, distúrbio provocado pela perda de sustentação de órgãos que constituem o assoalho pélvico. Confira a entrevista com a Dra. Augusta Morgado, Ginecologista da equipe do Increasing, e saiba mais detalhes sobre os fatores de risco, os sintomas e as formas de evitar e tratar esse problema:

O que é exatamente um prolapso genital?

Dra. Augusta: A palavra “prolapso” vem do termo em latim “prolapsus”, conjugação do verbo “prolābi”, que significa “cair ou deslizar”. Sendo assim, o termo médico “prolapso genital” refere-se ao deslocamento dos órgãos genitais femininos de sua posição original – útero, colo uterino e vagina –  e também de outros órgãos pélvicos, como a bexiga. Pela postura ereta do ser humano e pela força da gravidade, a tendência destes órgãos é descer pelo caminho da entrada da vagina e, por muitas vezes, se exteriorizando por ela. Isso causa a sensação de que há um abaulamento, uma bola, na região vaginal, dando origem aos outros termos pelo qual o prolapso pode ser conhecido como “bola na vagina”, “bexiga baixa” ou “bexiga caída”.

Quais são as principais causas do prolapso?

Dra. Augusta: O prolapso ocorre pela perda da sustentação dos órgãos pélvicos. Normalmente, o útero, a bexiga, o reto e as paredes vaginais estão mantidos em sua posição por uma trama de fibras e ligamentos compostos por colágeno e outras substâncias que se ligam à parede da pelve e a outros órgãos pélvicos. Enquanto esta rede estiver firme, os órgãos serão mantidos em sua posição. No entanto, se houver o enfraquecimento desta estrutura ou se a mesma for submetida a estiramento, peso ou pressão além do que ela puder suportar, ocorrerá a perda de sua função de sustentação e, consequentemente, a queda dos órgãos de sua posição original.

Seu acontecimento será, provavelmente, decorrente de uma série de causas que, em conjunto, favorecerão a perda da sustentação. Das mais comuns que conhecemos estão: as múltiplas gestações e gestações de gêmeos; vários partos normais, principalmente de bebês com o peso superior a 3,5 kg; partos por fórceps; pegar pesos ou fazer atividades de muito impacto de forma habitual; outros tipos de esforços crônicos e condições que aumentem a pressão abdominal, tais como a tosse crônica e obesidade; perda de tônus e força muscular decorrentes de mudanças ocorridas após a menopausa, como a diminuição dos níveis de estrogênio e enfraquecimento do colágeno; além da fragilidade do colágeno por causas genéticas.

O que é recomendado para prevenir o prolapso genital? 

Dra. Augusta: As gestações e partos devem ser sempre muito bem assistidos, além de um bom acompanhamento na hora do nascimento, o ideal é haver o seguimento em conjunto da gestante por um profissional da fisioterapia especializado em assoalho pélvico, que seja capaz de prepará-la durante toda a gestação focando no fortalecimento de músculos e treinamento para o memento do parto. Evitar o excesso de peso evita também o aumento de pressão dentro do abdome, que pode sobrecarregar a sustentação dos órgãos pélvicos. Uma boa nutrição melhora a qualidade de nossas células e tecidos, auxiliando na formação de ligamentos e fibras menos suscetíveis aos danos mecânicos. Evitar atividades de impacto repetitivo ou levantamentos de grandes cargas também podem auxiliar na prevenção. No entanto, isso não significa uma proibição a atividades esportivas ou laborais que envolvam esse tipo de esforço. Aprender a fazer os exercícios e as atividades da forma correta, com aparelhos adequados e com manobras de proteção do períneo durante a execução da força ajudam a reduzir muito o potencial de lesão destas atividades.

Por que as mulheres são mais suscetíveis à ocorrência de prolapsos?

Dra. Augusta: As mulheres, em geral, têm mais fatores de risco de prolapsos que os homens. As condições anatômicas dos órgãos pélvicos em suspensão e a presença de um orifício natural por onde os órgãos podem descer, por si só, já fazem com que elas estejam mais suscetíveis. Além disso, fatores muito característicos das mudanças fisiológicas dos ciclos de vida da mulher, como as gestações e alterações hormonais esperadas no climatério, estão bastante relacionadas a maior incidência dos prolapsos.

Há alguma particularidade em casos que envolvem os homens?

Dra. Augusta: Isso também pede acontecer com homens. Neste caso, estaremos falando do prolapso retal, que envolve a descida do reto de sua posição habitual e sua exteriorização por via anal. Apesar de ser mais frequente em mulheres, homens, principalmente com mais de 50 anos, podem apresentar esta condição, principalmente se apresentarem os fatores de risco, que incluem diarreia ou constipação crônicos; necessidade de esforço para evacuar por longo período; idade avançada, que pode contribuir para a fraqueza de músculos e ligamentos da área anal e retal; cirurgias ou lesões prévias em região anal, perineal ou de quadril; e ainda lesões ou compressões de nervos da pelve que controlam a abertura e o fechamento do esfíncter anal.

Isso pode vir a ocorrer em pessoas de todas as idades?

Dra. Augusta: Pela sua natureza de perda de resistência e fragilização dos músculos e ligamentos que sustentam os órgãos pélvicos, os prolapsos tendem a ser mais comum após os 50 anos. Nas mulheres essa ocorrência está claramente associada ao climatério e à diminuição dor níveis de estrogênio e piora de qualidade de colágeno, e nos homens pela piora do tônus muscular e perda de resistência dos músculos e ligamentos. No entanto, o prolapso pode ocorrer em todas as idades, desde mulheres em idade ferétil, principalmente por fatores relacionados a gestação e parto e, até mesmo em crianças de idades variadas, geralmente por associação a outras doenças congênitas ou adquiridas.

Quais são os sintomas?

Dra. Augusta: A apresentação do quadro pode ser bastante variada. Há quadros em que não há nenhum sintoma além da própria visualização ou palpação do órgão que está fora do lugar através da vagina ou do reto, como um volume ou bola. Em alguns casos mais avançados pode haver sangramentos e infecções locais por esfolamentos e atrito órgão com a roupa íntima.

Em outras situações pode haver, independente da percepção deste abaulamento, a sensação de dor em baixo ventre, frequentemente referido como uma sensação de peso, que é mais leve pela manhã e vai se agravando ao longo do dia, conforme a pessoa fica em pé e faz suas atividades diárias, e com melhora ao se deitar. Outro sintoma frequente é a dificuldade de esvaziamento da bexiga e do reto. O prolapso pode funcionar como um obstáculo à saída da urina e das fezes. Sensação de que a bexiga não esvazia bem ou de que há sempre urina na bexiga, jato fraco e gotejamento após urinar, pressa em ir urinar ou desejo que vem subitamente demandando a busca imediata de um banheiro podem estar tipicamente associadas a queda do útero e da bexiga, principalmente. Já sintomas de dificuldade de evacuação como esvaziamento incompleto do reto com sensação que sempre há fezes presas após a evacuação podemos sugerir o prolapso do reto por via vaginal. Já urgência evacuatória com ou sem escape de gases ou fezes, sangramento na região anal ou durante a evacuação podem ser sugestivos também de prolapso retal.

Como é realizado o diagnóstico?

Dra. Augusta: O diagnóstico é feito baseado nos relatos do indivíduo sobre seus sintomas, que associados, já são muito sugestivos de um quadro de prolapso, associados aos achados de um exame físico bem detalhado, que incluem os exames ginecológico e proctológico. Esta avaliação deve incluir, além da visualização, exames de toque vaginal e retal, a realização de manobras de esforço e algumas vezes mudanças de posição, como ficar em pé, por exemplo. Desta forma o médico consegue identificar o órgão que está fora de sua posição, a provável origem do defeito que causou o problema e a gravidade do prolapso. Os exames complementares podem auxiliar na investigação de outros problemas associados, como o Estudo Urodinâmico e a Ressonância Nuclear Magnética da Pelve, que pode funcionar como uma boa forma de documentação anatômica dos prolapsos identificados. É importante ressaltar que, apesar da utilidade desses exames para casos específicos, a consulta médica com uma boa conversa e identificação de sintomas e a avaliação física ainda são insubstituíveis no processo de investigação destes casos.

Quais são as diferentes opções de tratamento disponíveis para prolapso?

Dra. Augusta: O tratamento do prolapso vai ser indicado conforme a necessidade sentida pelo paciente ou mediante complicações secundárias.

A presença de infecções, complicações renais ou intestinais, bem como as condições de saúde nas quais o indivíduo se encontra, serão fatores determinantes na opção pelas variadas formas de tratamento. Havendo estabilidade do quadro e ausência de gravidade, o tratamento será oferecido de acordo com o grau de queixa do paciente. Isso inclui a avaliação de dor associada, e até alterações bastante individuais de autoestima e qualidade de vida e avaliação de sintomas urinários e intestinais.

Nos quadros mais graves, com comprometimento de outras funções do organismo pelo prolapso, estão indicados métodos que revertamos danos do mesmo, que podem ser cirúrgicos ou conservadores. Se for do desejo do paciente e houver condições clínicas, podem ser realizadas cirurgias que buscam reconstituir a anatomia normal e "recolocar” os órgãos em sua posição de origem, dando-lhes mais sustentação. Estes procedimentos podem ser feitos por via vaginal, anal, abdominal e até por videolaparoscopia; com ou sem o auxílio de telas sintéticas), normalmente feitos por ginecologistas, uroginecologistas, urologistas e proctologistas.

Na ausência de possibilidades ou desejo de realizar a cirurgia, pode se optar por outros tratamentos, como o uso de um pessário, nos casos dos prolapsos genitais. O pessário é uma estrutura de silicone, que pode ter diversas formas, sendo a mais habitual a forma de anel, que é colocada dentro da vagina de forma a sustentar e manter os órgãos pélvicos em sua posição habitual, revertendo de forma bastante eficiente as queixas causadas pelo prolapso, sem a necessidade de um procedimento cirúrgico. Sua colocação é fácil, pode ser feita no consultório sem necessidade de internação ou anestesia, como se fosse um exame ginecológico de rotina, e os cuidados de higiene, inserção e retirada deste dispositivo podem ser mantidos rotineiramente. Ainda dentre os métodos conservadores temos a fisioterapia pélvica, que além de importante na prevenção de casos de prolapso, como já foi dito, pode ter um excelente resultado na melhora de sintomas e das funções urinária e intestinal relacionadas ao quadro.