Existem dados substanciais que mostram que restrições ou abusos ambientais determinam riscos importantes para diversas doenças e alterações metabólicas. Há evidências emergentes que demonstram que o excesso de peso está associado ao aumento do risco de vários tipos de câncer, como colorretal, pâncreas, endométrio, ovário, mama e outros.
Sabe-se que o aumento na suscetibilidade a doenças, entre elas as neoplasias malignas, podem ter origem genética ou ambiental.
Atualmente, há um número significativo de evidências que demonstram que algumas respostas genéticas podem ser modificadas ao longo de um período por fatores ambientais, tornando o meio ambiente um fator de extrema importância na expressão maior ou menor de genes. Assim, os fatores ambientais podem modular as respostas dos genes, fazendo com que a genética não seja “destino”.
Entre os fatores ambientais de importância para essa modulação, destaca-se o potencial da alimentação e da nutrição. A alimentação tem um papel bem definido na modulação de respostas orgânicas, podendo controlar o comportamento de determinadas doenças, condições e toxicidades.
O estudo desses mecanismos moleculares - por meio dos quais o ambiente controla a atividade genética - é conhecido como epigenética. Assim, epigenética ou herança epigenética são variações não genéticas adquiridas durante a vida de um organismo, que podem ser passadas para os descendentes, ou seja, qualquer atividade reguladora de genes que não envolve mudanças na sequência do DNA (código genético) e que pode persistir por uma ou mais gerações.
Sabe-se que os compostos bioativos desempenham papel metabólico, alterando a forma que um gene se expressa, ou seja, o fenótipo, implicando em diferentes resultados para a saúde do indivíduo. Vários componentes alimentares bioativos são potencialmente capazes de modular, principalmente, a metilação do DNA e isso também pode influenciar a suscetibilidade ao câncer, bem como outras doenças e respostas.
Os principais nutrientes envolvidos nessa interação incluem algumas vitaminas como retinol (vitamina A), cianocobalamina (vitamina B12), piridoxina (vitamina B6) e folato, além de alguns aminoácidos como a metionina e a colina.
Outros componentes alimentares bioativos também demonstram influenciar a metilação do DNA, incluindo zinco, selênio e genisteína.
Existem evidências de que o consumo de uma dieta saudável por um período de um ano, com base na dieta do Mediterrâneo, por exemplo, pode reduzir os níveis de metilação em genes específicos ligados a algumas doenças crônicas.
No contexto do tratamento, também há preocupação com a qualidade da alimentação. Os tratamentos contra o câncer com quimio e radioterapia, além de serem promotores de mutações, são altamente geradores de radicais livres e depletam vários nutrientes e compostos importantes nas defesas do organismo e na redução dos efeitos negativos destes nos tecidos sadios.
Alguns exemplos de relações importantes são:
- deficiência de zinco com inibição da resposta inflamatória;
- zinco com a reparação de lesões nas enterites/mucosites e feridas em geral;
- deficiência de selênio e vitamina E, predispondo ao maior risco de toxicidade e doença cardíaca.
Considerando esses dados, a qualidade da dieta exerce um papel relevante, tanto no contexto preventivo do câncer quanto no contexto terapêutico, durante e após o tratamento.
Preparações dietéticas saudáveis, ou seja, ricas em alimentos funcionais (nutrientes e compostos bioativos) e com baixos níveis de compostos tóxicos, oxidantes e pró-inflamatórios como corantes, conservantes, açúcares e gorduras saturadas são indicados.
Apesar disso, o quanto o hábito alimentar pode ser responsável por modificar essas respostas em pacientes oncológicos pediátricos ainda precisa ser estudado para ser melhor definido.
Há evidências da influência de agentes fitoquímicos dietéticos no tratamento quimioterápico, sendo extremamente necessário no processo de terapia para aumentar a chance de cura dos pacientes. Diferentes compostos naturais podem melhorar a eficiência do tratamento. Por outro lado, há evidências controversas quanto à suplementação de doses excessivas de alguns nutrientes que podem interferir com as respostas dos tratamentos e, também, como promotores de câncer.
Alguns efeitos benéficos descritos são:
- redução da resistência a agentes quimioterapêuticos;
- redução e alívio dos efeitos adversos da quimioterapia e da radioterapia;
- ajuda na desintoxicação do organismo quanto aos medicamentos;
- prevenção do excesso de formação de radicais livres;
- outros.
Ao mesmo tempo, é importante estar ciente de que alguns agentes fitoquímicos, principalmente se oferecidos em doses excessivas, por meio de suplementação artificial, podem ter efeitos indesejáveis tóxicos e influenciar negativamente os resultados do tratamento.
Portanto, salvo em condições de necessidade de terapia nutricional especializada, a dieta, por meio de alimentos naturais, deve ser o objetivo primário do aconselhamento nutricional para todos os indivíduos durante o tratamento oncológico e após este.
Levando-se em consideração que crianças podem ter mais dificuldades de aceitação dietética do que adultos, a elaboração de preparações especiais e receitas atrativas, que incluam alimentos ricos em nutrientes e compostos bioativos é uma das facetas da terapia nutricional em pacientes pediátricos com câncer.
Por Adriana Garófolo, nutricionista - CRN: 10744
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